segunda-feira, setembro 06, 2010

Sobre não-relacionamentos com sentido

“Nós dois juntos” daria uma história bonita pra caramba de contar. Mas somos incompatíveis. Ele culpa as mulheres por suas neuroses constituintes. Eu acredito que cada ser implicado na relação tem sua porção de responsabilidade. Ele vai direto ao ponto. Eu só sou seduzida e sei seduzir pelas sinuosidades. Nós somos contraditórios e é fato que, mais cedo ou mais tarde, minhas contradições o sufocariam e as contradições dele me fariam mal. Acho que nós somos amigos ao menos. Acho. É uma amizade estranha, sem intimidade, só com bem querer. Talvez seja justamente isso que nos mantenha salvos da complexidade e detalhes sórdidos da convivência. E por isso, não há nenhum tipo de ressentimento entre nós. Nenhum rancorzinho pra macular nossa não-relação. Porque não há mais nada, além do saudosismo e do gosto pela ironia, que nos mantenha ligados e justifique este relacionamento. Porque se houvesse mais profundidade do que isso as coisas não dariam tão certo. Eu tenho medo da crítica ácida dele. Ele talvez ache estranho meu jeito evasivo. Se é que ele desperdiça algum milésimo de segundo do tempo dele pra pensar no meu jeito evasivo. Nós rimos das nossas piadas com conteúdo (às vezes impróprios para menores) e temos um jeito especialmente cínico de nos tratar. Eu já escrevi poemas piegas de amor pra ele no meu diário adolescente. Hoje não escrevo mais poemas, nem piegas, nem em diários. Meu escrever agora é dedicado ao escárnio pelos relacionamentos cor de rosa de contos de fada inexistentes e às oportunidades de rir das minhas próprias desgraças. É é quase uma desgraça não crer mais em certas coisas. Acho que ele também não acredita em relacionamentos cor de rosa de contos de fada inexistentes e nisso somos parecidos. Mas eu aceito que sou limitada e tenho defeitos. Não posso responder por ele neste aspecto. Ele é uma coisa boa que remete a um tempo muito feliz da minha vida. E estende minha juventude de recordações. E nós envelhecemos juntos, no mesmo mês. Ele é a prova viva de que todo sentimento pode ser ressignificado. Que qualquer apego pueril pode transcender para admiração e boas lembranças sem que seja preciso carregar qualquer sombra de sofrimento. Ele confirma minhas crenças de que o único relacionamento saudável que é possível pra mim é aquele no qual não haja tanta aproximação, porque quando há aproximação eu enlouqueço de carência. Com ele eu me sinto meio-segura-meio-insegura, o que já é bom porque em qualquer outro relacionamento eu só me sinto meio-insegura-meio-desesperada. Com ele eu não sei o que esperar e nem espero. Porque é só no nosso não-relacionamento que eu me mantenho salva da selva dos sentimentos desgastantes e efêmeros. É difícil explicar, mas de um jeito ou de outro, na realidade da vida ou no meu diário adolescente, nós somos pra sempre.

2 comentários:

Raimundo Neto disse...

Ai! Ai! Ai!

Cheio de intensidade mirada pra mim.

" Ele confirma minhas crenças de que o único relacionamento saudável que é possível pra mim é aquele no qual não haja tanta aproximação, porque quando há aproximação eu enlouqueço de carência."

"É difícil explicar, mas de um jeito ou de outro, na realidade da vida ou no meu diário adolescente, nós somos pra sempre."

Somos nós!

Raimundo Neto disse...

Jannaaaaaaaaaa!

O blog ficou LINDOOOO, LINDOOO, LINDOOO!

Ficou assim clean...e aberto...espaçoso...arejado. Entende?

Parabéns! Mesmo, mesmo!