quarta-feira, fevereiro 01, 2012

FALA QUE EU TE CURTO!

"Sofremos com todas as forças que nos obrigam a nos exprimir quando não temos grande coisa a dizer" (Gilles Deleuze)

“Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo” (Raul Seixas)


Em épocas como a de agora, em que a virtualidade ganha mais espaços do que a realidade na vida, é inevitável se questionar e, por vezes, se incomodar e se enfadar com essa necessidade de se exprimir o tempo todo. Deleuze e Raul já falavam disso há nem sei quanto tempo, quando a tecnologia ainda nem era mais uma força pressionando a expressão de qualquer opinião sobre qualquer assunto. Em tempos de twitter e facebook, se fala indiscriminadamente de qualquer coisa. As informações passam por nós de forma tão frenética que quando nos damos conta estamos lá, emitindo opiniões, fundamentadas ou não, compartilhando, retuitando, curtindo, ofendendo, criticando ou tão somente respondendo obedientes às perguntas “No que você está pensando agora?; O que está acontecendo?”. 

Nem sempre o que pensamos ou o que acontece em nossa intimidade precisa ser exposto pra qualquer pessoa. Nem sempre o que pensamos ou o que acontece em nossas vidas é realmente relevante. Essa exposição a que nos alienamos é perigosa e invasiva. Vez ou outra nos encontramos, satisfeitos ou insatisfeitos, via redes sociais, proclamando nossas angústias, felicidades, desejos, conhecimentos sobre cultura à espera de qualquer manifestação de outras pessoas que amparem os mesmos sentimentos pra nos sentirmos aceitos. Eu entendo a necessidade de pertença. É um recurso social de sobrevivência. Também vislumbro as redes sociais como instrumentos de cidadania, de propagação de manifestações genuínas de posturas políticas que, na maioria das vezes, promove mudanças significativas, ainda que não grandiosas. Também compreendo que a vida se movimenta pra mudanças que não devem ser negligenciadas, como as tecnologias atuais. Até porque, mais uma vez, o sentimento de pertença existe pra que não deixemos de ser grupo. 

O alcance das informações difundidas nas redes sociais não é o problema. O problema reside na forma como lidamos com as informações que chegam até nós. O problema é a falta de filtro. Deve existir algo que se queira guardar pra si mesmo ou pra intimidade partilhada com as pessoas mais queridas e mais próximas. O problema é que estamos sofrendo desse mal que não nos permite mais ser seletivos. Não somos seletivos quanto a quem queremos ao nosso lado, seja como amante ou como amigo, nem com as informações que importam, nem com a emissão de nossas visões de mundo. Nessa era pós-moderna é assim: tudo junto e misturado. Quem não tem peneira deixa passar tudo e se perde ao desconsiderar o que é essencial. Hoje em dia, quem tem um smartphone não perde mais nada da vida, exceto a vida real, a vida em volta, a vida do amigo que está logo ali, na cadeira ao lado, no mesmo restaurante que está sendo marcado nos aplicativos do facebook.


Este texto surgiu da minha insatisfação sobre o mau uso de ferramentas que podem servir pra coisas muito mais nobres, insatisfação que estava prestes a ser publicada nas minhas redes sociais. Essa é a grande ironia: criticar coisas que nós mesmos fazemos. Porque o facebook e twitter estão cheios de publicações recheadas de posturas políticas do tipo “Eita, Brasilzão sem jeito!”, “Esses políticos são o câncer do país”; “Brasileiro precisa aprender a votar direito, seja nas urnas, seja pra quem deve sair do BBB”, “Odeio todo tipo de reality show, mas, por acaso, soube daquele estupro. Isso é um absurdo. Aonde vamos parar? Manda matar o Bial”; “A Luiza voltou do Canadá, tá famosa e eu não vou me posicionar sobre o assunto. Só digo que acho tudo isso uma besteira”. Olhar pras nossas próprias contradições é um ato corajoso e de sanidade. Brasileiros somos nós, usuários de twitter e facebook, então, não faz sentido criticar se nos colocamos como meros expectadores. Nesse caso, eu também não sei votar. Também acho que a repercussão sobre a Luiza no Canadá e sobre o suposto estupro no BBB são duas grandes bobagens, mas expor isso na minha timeline já é falar sobre o assunto e, por conseqüência, participar da propagação da besteira. 

Ter crítica é desconfiar com moderação. É o meio do caminho entre opinar sem saber do que se trata e se insatisfazer sem saber a procedência. É tentar ser, no mínimo, coerente. É checar a informação pra se saber se é necessário mesmo opinar. É tentar questionar posturas que lhe fazem mal, com as quais não se concorda mais. É mudar de idéia, mas é, acima de tudo, agir conforme o que se pensa e pra isso é preciso problematizar. Problematizar inclusive a sua vida, as suas posturas, as suas visões de mundo, porque se a incoerência publicada de alguém incomoda mais do que as suas próprias incoerências é hora de verificar se as vias de informação que se usa ainda fazem sentido. O que quero dizer é que sendo eu responsável por minhas ideias e exposições delas, sou também responsável pela ferramenta que utilizo, portanto, antes de me ressentir com alguma ideia publicada, por que não ignorar? Afinal de contas a liberdade de expressão ainda é um direito, mas se a insatisfação é gigantesca quanto ao que está sendo exposto chega a hora de utilizar outros serviços oferecidos pelas mesmas ferramentas. É aí que se faz necessário o uso, com responsabilidade e sem culpa, dos botões: bloquear e excluir amizade. Como se vê, tudo depende mesmo de um posicionamento pessoal, desde que seja coerente. (Des)curta quem (des)curtir.

4 comentários:

Raimundo Neto disse...

Suas ideias agora são minhas. E compartilhadas.

É uma das minhas pensadoras preferidas.

Juliana disse...

=O (incrível!)

Julianna Paz disse...

Ah, agora entendi porque esse texto vem sendo tão compartilhado no facebook...

Só posso te dizer uma coisa #amomuitotudoisso

Leilianne disse...

leio e releio esse texto é sinto cada palavra e sei bem do que vc está falando,..wow amiga..n se faz mais pessoas como a gnt...kkkkkkkk...Te amo